23 de novembro de 2010

smoke.


first he took an unsmoked cigar and he put it on a balance and weighed it. then he lit it up. he smoked the cigar, carefully tapping the ashes into the balance pan. when he was finished, he put the butt into the pan along with the ashes. he weighed what was there, then he subtracted that number from the original weight of the unsmoked cigar. 
the difference was the weight of the smoke.
(smoke,  wayne wang)

16 de novembro de 2010

guilt.


o despertador toca.
já é de manhã? merda... que dor de cabeça infernal. 
olho em volta. como fui aqui parar? estou vestida. porque é que estou vestida?
levanto-me e vou tacteando as paredes brancas do meu quarto escuro até à casa de banho. 
engulo a seco. tenho sede, tenho tanta sede. abro a torneira e bebo a água tépida servida nas minhas mãos.
olho-me ao espelho. assusto-me e recuo um passo. a minha cara, os meus olhos.. o que é que se passou? merda..não me lembro de nada.
olho fixamente o rosto que não reconheço: o olhar perdido e negro que vai ficando turvo e vazio. 
perco a visão e os meus ouvidos ampliam o silêncio ensurdecedor em que está presa a minha mente. de repente ouço sirenes, ouço carros a buzinar, pessoas que gritam por ajuda, uma confusão inexplicavelmente familiar. 
recupero a visão e perco momentaneamente os sentidos. 
ainda atordoada pela experiência extra-sensorial que acabo de viver, agarro-me ao lavatório e molho a cara com àgua fria. não consigo entender.. o que se passa? os meus olhos vermelhos,  banhados em pequenas lágrimas geladas são espelhos do terror que sinto cá dentro. não percebo, não consigo entenderbebi? não me lembro de ter bebido. não, não bebi. o meu hálito não tem o travo bafiento com que acordo depois de beber. 
preciso de sair de casa. volto ao meu quarto escuro e agarro na carteira. preciso de sair de casa. 
abro a porta da rua. merda, está frio...não quero saber. a claridade da manhã fere-me os olhos e o latejar da minha dor de cabeça ainda me incomoda. sinto uma estranha agonia ansiosa cuja origem não consigo identificar ainda. quero ignorá-la, mas não consigo.
vou andando, sem destino. preciso de ir andando.

(continua...)

9 de novembro de 2010

tempestades.


Sometimes fate is like a small sandstorm that keeps changing directions. You change direction but the sandstorm chases you. You turn again, but the storm adjusts. Over and over you play this out, like some ominous dance with death just before dawn. Why? Because this storm isn't something that blew in from far away, something that has nothing to do with you. This storm is you. Something inside of you. So all you can do is give in to it, step right inside the storm, closing your eyes and plugging up your ears so the sand doesn't get in, and walk through it, step by step. There's no sun there, no moon, no direction, no sense of time. Just fine white sand swirling up into the sky like pulverized bones. That's the kind of sandstorm you need to imagine.

An you really will have to make it through that violent, metaphysical, symbolic storm. No matter how metaphysical or symbolic it might be, make no mistake about it: it will cut through flesh like a thousand razor blades. People will bleed there, and you will bleed too. Hot, red blood. You'll catch that blood in your hands, your own blood and the blood of others.

And once the storm is over you won't remember how you made it through, how you managed to survive. You won't even be sure, in fact, whether the storm is really over. But one thing is certain. When you come out of the storm you won't be the same person who walked in. That's what this storm's all about.

(Kafka on the shore, Haruki Murakami)

os ventos levantam-se enquanto as nuvens bloqueiam o luar. ao longe os tambores anunciam a chegada da tempestade. chove pouco, por enquanto os meus passos ecoam mais alto. vou passeando na rua despida de gente. chove muito, apresso o passo à procura de um abrigo. o som dos trovões aumenta ao mesmo tempo que os raios rasgam a negridão da noite. tenho pressa, mas hesito: agora a chuva é uma cortina que não me deixa ver o caminho. insisto, a trovoada não me mete medo. avanço. a chuva corta-me a pele à medida que avanço para lado nenhum. o meu corpo começa a ceder, não sou assim tão forte. já não consigo avançar, sinto a cabeça a cair e resigno-me à fraqueza da minha condição. desisto, mas só por hoje. hoje não. amanhã é um novo dia.
até amanhã.